Sono desajustado. Fome errada. Paz influenciada. Calor
curitibano, preguiça baiana. E meu copo de leite quente. Não calmante, não
remédio. Só leite com chocolate quente. Sem pensar no tempo que eu tenho a minha
disposição, ao meu cavalete de pintura fiel que – por semanas a fio – permanece
ao lado da cama, confiante que eu vou, em algum momento, me ater a sua função.
O teclado mudo. Tudo porque a arte não fluiu mais. Porque em algum momento eu
não precisei mais da desordem da minha vida, a discórdia consagrada, ou os
nossos sorrisos flutuantes em domingos de sol e almoço na casa dos seus
parentes. A fotografia também se dissipou. Entende, moreno? Acabou. Não eu, não
você, não os domingos. A vontade. A vontade de expressar nosso café e o
creme-de-canela nos meus quadros, na minha poesia ou no meu instrumento, se
antes eu queria tanto e agora é tarde demais. E não é por sua culpa, não é. Mas
eu também não sei escrever sobre mais nada. Tua alma, ao que diz contato com
teu cabelo, teu perfume, ou tua cor da pele, são acalentos. É tudo acalento. E
agora, nessa mesma madrugada, se eu me pego me perguntando sobre a princesa que
você andou escrevendo num dos teus textos nesses últimos meses, veja bem, eu
tenho vontade de atirar no chão meu leite com achocolatado que, até eu terminar
teu texto, já esfriou. O problema não é a vodka que tá faltando aqui, é a tua cor morena nos meus quadros em branco, empilhados no canto do
quarto. O teu timbre suave, que toda vez que você fala me faz pensar que tua
voz deveria, sim, soar mais forte, porque todas as vezes que você ri eu tenho
essa vontade chata, injuriante, de deitar no teu colo e rir contigo até a
risada cessar e você começar, enfim, a me apertar com mais força e eu te fazer parar o
carro em uma rua sem movimento pra que a gente ria cada vez mais junto, pra depois
deixar a risada sem graça pra mais tarde, porque eu ainda tenho, sim, essa
vontade de ti. Não tô pedindo
nada, moreno, mas tô querendo tudo. Te deixo fotografar meu perfil do lado que
mais odeio se você topar descer a Graciosa ouvindo Milo Greene enquanto eu
troco de roupa na estrada. Te dou aquele livro da protagonista lasciva - com
dedicatória - antes de você viajar (pela terceira vez) se você voltar e me
levar num show do Cícero. Mas volta. Que é pra eu me aconchegar no teu peito
enquanto choro a história de um andarilho. Que é pra você me levar pra velejar
enquanto eu canto You Are My Sunshine. Que é pra gente viver aquelas viagens a
dois que ficaram só na nossa cabeça. Volta pelo teu mocha. Volta pelo meu
macarrão. Pelos nossos passeios com o seu cachorro. Volta.