terça-feira, 26 de maio de 2015

Certa noite, pescando abstinência de presença no ar, ele me apareceu como quem não quer nada, como quem segura uma faca com a mão esquerda atrás das costas, só pra dizer que os devaneios de amores passados, na verdade, não existiram. Enrijeci. Meia noite, o sono chegando de fininho e dizendo que não pretendia ficar por muito tempo, eu lutando pra terminar uma garrafa de água inteira, e ele já vai logo virando as costas, só pra me plantar a certeza de que veio com a intenção de pregar RIP na porta da minha paz.

domingo, 23 de fevereiro de 2014

Creme de canela

Sono desajustado. Fome errada. Paz influenciada. Calor curitibano, preguiça baiana. E meu copo de leite quente. Não calmante, não remédio. Só leite com chocolate quente. Sem pensar no tempo que eu tenho a minha disposição, ao meu cavalete de pintura fiel que – por semanas a fio – permanece ao lado da cama, confiante que eu vou, em algum momento, me ater a sua função. O teclado mudo. Tudo porque a arte não fluiu mais. Porque em algum momento eu não precisei mais da desordem da minha vida, a discórdia consagrada, ou os nossos sorrisos flutuantes em domingos de sol e almoço na casa dos seus parentes. A fotografia também se dissipou. Entende, moreno? Acabou. Não eu, não você, não os domingos. A vontade. A vontade de expressar nosso café e o creme-de-canela nos meus quadros, na minha poesia ou no meu instrumento, se antes eu queria tanto e agora é tarde demais. E não é por sua culpa, não é. Mas eu também não sei escrever sobre mais nada. Tua alma, ao que diz contato com teu cabelo, teu perfume, ou tua cor da pele, são acalentos. É tudo acalento. E agora, nessa mesma madrugada, se eu me pego me perguntando sobre a princesa que você andou escrevendo num dos teus textos nesses últimos meses, veja bem, eu tenho vontade de atirar no chão meu leite com achocolatado que, até eu terminar teu texto, já esfriou. O problema não é a vodka que tá faltando aqui, é a tua cor morena nos meus quadros em branco, empilhados no canto do quarto. O teu timbre suave, que toda vez que você fala me faz pensar que tua voz deveria, sim, soar mais forte, porque todas as vezes que você ri eu tenho essa vontade chata, injuriante, de deitar no teu colo e rir contigo até a risada cessar e você começar, enfim, a me apertar com mais força e eu te fazer parar o carro em uma rua sem movimento pra que a gente ria cada vez mais junto, pra depois deixar a risada sem graça pra mais tarde, porque eu ainda tenho, sim, essa vontade de ti. Não tô pedindo nada, moreno, mas tô querendo tudo. Te deixo fotografar meu perfil do lado que mais odeio se você topar descer a Graciosa ouvindo Milo Greene enquanto eu troco de roupa na estrada. Te dou aquele livro da protagonista lasciva - com dedicatória - antes de você viajar (pela terceira vez) se você voltar e me levar num show do Cícero. Mas volta. Que é pra eu me aconchegar no teu peito enquanto choro a história de um andarilho. Que é pra você me levar pra velejar enquanto eu canto You Are My Sunshine. Que é pra gente viver aquelas viagens a dois que ficaram só na nossa cabeça. Volta pelo teu mocha. Volta pelo meu macarrão. Pelos nossos passeios com o seu cachorro. Volta. 

sábado, 31 de agosto de 2013

Marujo

Que mar, que azul, que fundo, que clichê.
Do triângulo no meu braço. Eu te falei da regra de três e você guardou para si, assim como a excessão do meu acordar das 4am, e me incluiu na terceira pessoa do singular. Terceira. Tão menos importante que a segunda, mas ainda assim. E não passa agora, mas ainda é mais que a terceira do plural, pouco menos que a primeira... Breve. É como uma fotografia de câmera polaroid, meu querer, vai se revelando aos poucos, vai escurecendo, colorindo, saturando... Não. Saturando não. Eu lhe permito que me colora, de enrubescimento em noite de neblina; que me escureça, enquanto cessa os olhos por exaustão, mas que me sature, não. Saturação é além do limite, é demais, e-xa-ge-ro, encheção de saco. É afogamento por água salgada. E desse mar que nos balança, meus lamentos, mas eu só permito um naufrágio desde que nós, como capitães do barco da mesma vida, não o abandonemos, marujo.

sexta-feira, 5 de outubro de 2012

Julho.


E essa tela azul acima da gente, é pra rir ou pra chorar? O céu brinca de se pintar, enquanto a gente acha motivo pra se afundar naquele mar interno, porque não importa se é cima ou baixo, o mundo gira no nosso devaneio de sentido aleatório pra nos deixar no centro, confusos, tansos e tontos; eu saí do torpor quando percebi que o vento, escuro e forte, causava medo, e enquanto olhava pro mar inverso de pontos luminosos lá pra cima, como se cima fosse baixo e baixo fosse tudo. 

Lamúria alternativa.


Um miado do vento no rodopio de um salto inglês. Era tudo sobre não deixar os pés para fora da cama, meu bem, ou os copos que deixamos fora do descanso no bidê, caiu feito uma luva derramar todo seu conflito perante meus cílios curvos. Caiu feito um conflito derramar tua saliência em mim, cachinhos. Ou fosse o derrame dos meus olhos sobre o quarto que era cheio demais para tanto esconderijo, de qualquer modo, aumenta esse volume. E nem sequer pensa em deixar pra depois a fúria reprimida de agora, tu tens isso de querer lembrar-se de outrora, e ter medo de abrir e fechar os olhos na declamação de dor da noite.
- O que eras, afinal? Tu me perguntaste.
- Explosão de adrenalina e chutes involuntários, enquanto Eu queria estar em abraços quentes e inconscientes, sem noção do porquê de tu me olhares daquele modo.
Então tu só aumentas o som novamente, não é o suficiente, mas nem sequer usa a voz pra negar, não. Impaciência no bolo de sujeira, cigarros na noite passageira pra aliviar tua falta de ar, porque tu só sabes perder o olhar sentido que ela dá a todos os lados, exceto  ao que tu ocupas. Mas tu não sentes culpa, Gosto da Arrogância; engole meu veneno, escarra chocolate maciço, porque tudo que eu tenho pra te falar se cobre de mais uma camada de pó diariamente, e tu já pode até declamar pra mim. Miado à noite em que tu tens necessidade de atravessar as fronteiras pra se acolher de ternura, e passado o momento sentia a razão de poder erguer a voz e não dar satisfação. No final era só pra te lembrar de que havia quem queria sussurrar aonde tu gritavas, ou que ela escolhia quem lh’aquecia, e em certos momentos tu só parecia a escolha errada.

Mas te aquieta, meu bem, o que tu sentes eu sinto também.
Só que é mais. Só que não me satisfaz.
Então para de marcar e me chama, só me chama.

SóTão.


Olha pra cima. Respira, só respira. Levanta, anda no escuro pra olhar nos olhos do teu medo. Sente tudo arrepiando e aceita que não tens o que vomitar. Aceita que não tem nada pra jogar. Se recusa a sentir tudo de novo. Aprende que a arritmia é quem dá essa ânsia, e que tu vai ver teu peito pular, mas teu coração não vai pular pra fora, embora tu torças ao contrário. Lida com o fato de que dói; doeu, dói e vai doer, e que, no momento, o máximo que tu podes fazer pra desvirtuar é te aquietar debaixo daquele chuveiro gelado. Vai pintar; tua parede, tua alma. Tira essa corrente em volta do teu pescoço, tua mãe bem lhe alertou que ela te enforcaria, caso tu se esquecesses de e fosse dormir. Lida. Aprende a lidar. Muda. Vê a tua mudança. Só não permanece deitada, de corpo atado, frouxa, o pulso frouxo, a felicidade afrouxada. E seja aquela praia, aquela noite, e se deixa ser. 

- E eu não sei mais se o meu medo é o escuro ou o medo dele é que eu não tenha mais medo.

11.

E as luzes nem se apagaram ainda. Mas não era supostamente sobre o que deixamos passar, meu amor, pois eu estive evitando, para sempre, indiretamente, eu e você, ou os pés para fora da cama, mas infelizmente olhei para o buraco no teto e te pedi para acender a luz. E agora não sei mais se é receio ao susto ou à dor que outrora me proporcionou, a questão – sim, a questão – é que os pesadelos cessaram, realmente, mas tamanha fobia não se aquietou, não, e tu só dizes que é hipocondria e que os remédios são farinha - mas porque revelou, meu bem, eu precisava acreditar em algo na tua ausência, ainda mais na tua presença – e tudo que era branco, diziam os contos, nasciam pra gritar e me assustar, e é por isso que as lágrimas ainda não cessaram. Quarentena de temor, e eu nem vi, ou pressenti. Era sono, pois então, e eu tirei das tomadas o que havia restado dos sentidos, mas era sonho, agora, e a perna levantando involuntária assustou – a audição não ouvia nada, além de silêncio; o paladar dizia que precisava do doce, ou de tudo que tu dizias agora com receio de que fosse tarde demais; o olfato se encantou de lembrar a fragrância que restou dos últimos lençóis que deitamos; o tato te sentiu me abraçando, mesmo que não devesse sentir nada; e a visão... oh não, viu tua mão descansando imunda, em mim, em ti. Mesmo que não fosse a tua, aliás.